Anemia não é para veganos
Diet(ética) vegana – por Sônia T. Felipe
Até a pouco tempo, era certo ouvirmos as pessoas falarem, quando dizíamos que não comemos nada de origem animal: “Mas você vai ficar com anemia!” Há vinte e cinco anos atrás, quando parei de comer animais, me ameaçaram de morte. Morte intelectual. Eu ficaria anêmica, meu cérebro pararia de funcionar, eu não conseguiria mais fazer pesquisas, escrever, não aprenderia mais nenhuma língua estrangeira e minha vida teria acabado no dia em que eu parasse de ingerir cadáveres. Laticínios, então, nem pensar em abandonar! Isso me foi dito por uma médica homeopática, que ordenou que eu ingerisse então pelo menos dois litros de leite por dia, já que eu não ia mais comer carnes.
Se eu houvesse seguido tal conselho médico teria torturado as vacas por mais vinte anos e minhas artérias estariam estenosadas pelas placas provocadas pela destruição da plasmalema causada pela xantina oxidase, liberada no leite no processo de homogeneização das gorduras, e pelo excesso de cálcio solto que o leite de vaca injeta em nossos tecidos, porque sem o magnésio na proporção adequada, ele não pode entrar nos ossos. E eu teria destruído toneladas de grãos e cereais, de água potável e de florestas nativas para que as vacas pudessem secretar esse leite todo, uns 700 litros por ano, só para que eu garantisse os nutrientes que a totalidade dos frutos, das frutas, dos grãos e cereais integrais juntos não conseguiriam me dar! Por sorte, com meu espírito crítico e minha capacidade intelectual intocada pelos nutrientes obtidos dos alimentos vegetais, não caí nessa prescrição homeopática!
A preocupação das pessoas por nossa “anemia”, inevitavelmente, como todas as pessoas veganas estão cansadas de ouvir, vinha, e ainda vem, tanto de médicos quanto de pessoas sem formação acadêmica alguma, acompanhada da outra: “Mas como você faz para obter as proteínas?” Agora, depois que já começaram a ouvir que a dieta vegana é perfeita, desde que não seja a dieta junk food e sim a completa, com os alimentos comprados nas feiras e preparados para cada refeição, e não comprados em caixas, vidros e latas, as pessoas ainda temem que não comendo carnes, leites e ovos venham a ficar anêmicas.
O ferro heme, presente nas carnes, tem a fama de ser bom para a absorção. Só a fama mesmo. Tratando de uma anemia grave, causada por um medicamento (Plavix) em uma senhora de 90 anos (a anemia se foi quando o medicamento foi suspenso), um hematologista me disse que a quantidade de ferro contida em um comprimido do composto ferroso (prescrito para tentar reverter o quadro que não reverteu por mais de um ano, até que o cardiologista suspendeu o tal do Plavix), equivalia ao ferro de uns 100 kg de carne. Ele reconheceu que a carne não seria capaz de reverter a anemia.
Todas as pessoas anêmicas que conheço (algumas delas são professoras universitárias com doutorado e tudo) ainda comem carnes, leites e ovos. E sofrem de anemia. Então, se o tal do ferro heme fosse garantido na prevenção da anemia, essas pessoas não a sofreriam.
O leite e seus derivados, por sua vez, barram a absorção do ferro nos intestinos. A causa da anemia ferropriva em bebês é o fato de darem a eles o leite de vaca. As mães acham que tirando da dieta deles o leite delas e passando a dar o das vacas não vai fazer diferença, ou que até mesmo o leite de vaca é “mais forte”. Faz diferença. E para pior. Nunca para melhor.
O ferro que ingerimos das fontes vegetais é melhor absorvido se não ingerirmos alimentos derivados do leite ou mesmo o leite puro. Então, melhor lembrar disto: o leite de vaca não contém ferro na quantidade que precisamos. E, além do mais, ele atrapalha a entrada do ferro, contido nos alimentos vegetais, na corrente sanguínea. Por isso, é mais frequente a anemia em lacto-vegetarianos, do que em veganos que se alimentam de comidas vivas.
Para a vaca conseguir suprir de ferro um bebê humano, ele teria que ingerir de 28 a 31 litros de leite por dia. Esse montante basta para alertar que a natureza não previu que leite de vaca fosse um alimento capaz de fornecer ferro para humanos em qualquer idade. Anemia e consumo de leite de vaca estão associados na anemia ferropriva em bebês e crianças.
Arrisco uma explicação para o fato de que veganas e veganos que comem alimentos nutritivos (não os que se alimentam de comidas mortas, que chamo de dieta insana ou junk food), comem muitos alimentos ricos em ácido ascórbico ou vitamina C, junto com os que contêm ferro, importantíssimo para que o ferro possa ser bem absorvido, pois o ferro dos vegetais é um ferro não heme, e adora casar-se com a vitamina C antes de entrar na corrente sanguínea.
Então, lembrem-se: alimentos ricos em ferro adoram a vitamina C! Há alimentos que já contêm os dois, a uva e o figo maduro in natura, não aquele em lata, vidro ou cozido com açúcar, pois daí a vitamina C que era boa, já se foi!
Se comer outros alimentos que contenham ferro no almoço, coma pimentão, folhas verde escuro e use o limão espremido sobre eles. Pronto! Se não tem limão no restaurante ou em casa, lave e leve uma maçã e coma no almoço. A maçã (não a cozida e sim a crua) é uma espécie de coringa, combina com verduras, legumes, tubérculos e outras frutas. Ela é similar à cenoura, que, colhida da horta, combina com qualquer fruta. Pode ser comida, então, junto com outros alimentos que contenham ferro não heme (o ferro dos vegetais).
A dieta abolicionista vegana tem esses pequenos segredos ou feixes de luz, trazidos diretamente dos alimentos para nosso sangue e cérebro. O resto dos tecidos do nosso corpo e nosso espírito agradecem o que fazemos a eles, comendo coisas de acordo com seu prisma, suas nuances, sua eudaimonia (felicidade).
Dieta abolicionista vegana e viva é a dieta da felicidade. O resto é mercado de fármacos.
Adendo: Geralmente as pessoas pensam na laranja para comer com o feijão, porque estão acostumadas com a tradicional feijoada brasileira, que inclui, não é de graça, a laranja! Bem, a laranja, como o são as frutas ácidas de modo geral, melhor não comer misturada com outros alimentos. Por isso escrevi sobre o pimentão e a maçã, ambos ricos em ácido ascórbico e esquecidos por muitas pessoas. Quem come fora, pode acontecer de não ter no restaurante o limão fresco. Tem que ser o cortado pela pessoa, porque aqueles servidos já cortados em quatro perdem o ácido ascórbico com o contato com a faca e o oxigênio. Então, ou leva um limão na bolsa e corta no ato, ou uma maçã.
Sônia T. Felipe
– Fonte: http://www.veggietal.com.br/anemia-ferro-veganos/
Ferro na Dieta Vegetariana
Dr. George Guimarães
(Nutricionista especializado em dietas vegetarianas – www.nutriveg.com.br)
Se não for o mais recorrente de todos os mitos, o ferro certamente está entre os mais freqüentes quando o tema é a nutrição vegetariana. No entanto, a incidência de anemia ferropriva (por deficiência de ferro) não é maior na população vegetariana quando comparada à população onívora. Na verdade, ela é a deficiência nutricional mais comum em todo o mundo – estima-se que 500 milhões de pessoas sejam anêmicas. As mulheres estão em maior risco e as fases da vida de maior vulnerabilidade são: até os 4 anos de idade, durante a adolescência, durante a vida reprodutiva da mulher e durante a gestação. Esses grupos de risco precisam de atenção redobrada.
Por que é então que existe o mito com relação ao ferro na dieta vegetariana? De fato, parte do ferro encontrado nos produtos de origem animal é mais bem absorvido do que o ferro encontrado nos produtos de origem vegetal e de fato algumas fontes animais de ferro são muitíssimo superiores quando comparadas às fontes vegetais do mineral. Mas isto não significa que as fontes vegetais de ferro não sejam suficientes para suprir a necessidade do organismo humano. O fato de haver uma alternativa superior não faz da outra uma alternativa insatisfatória. No caso do ferro, a alternativa vegetal é satisfatória, mas alguns cuidados ajudam a garantir a ingestão e adequados. Esses cuidados compreendem a seleção de boas fontes do mineral, a inclusão de alimentos que melhoram a sua absorção e a exclusão de alimentos que a atrapalham.
Boas fontes vegetais de ferro são as leguminosas (com destaque para a lentilha, o grão-de-bico, a soja e o tofu), as castanhas e sementes (com destaque para as sementes de abóbora, de gergelim e a castanha de caju), os vegetais verde-escuros (especialmente a couve), as frutas secas (damasco, ameixa e uva-passa) e o melaço da cana-de-açúcar. Alguns cereais integrais também ajudam a complementar a ingestão de ferro entre os vegetarianos. Todos esses alimentos devem estar presentes em abundância na dieta vegetariana.
É notável que estes mesmos alimentos ricos em ferro sejam também boas fontes de cálcio e muitos deles também de proteínas. Ou seja, uma dieta vegetariana que esteja adequada em proteínas e em cálcio, estará necessariamente adequada em ferro. Há, no entanto, uma exceção a essa regra: se o cálcio estiver vindo primariamente dos laticínios, a ingestão de ferro poderá ser prejudicada, pois os laticínios estão entre as fontes mais pobres de ferro que existem. Toda vez que um vegetariano escolhe usar os laticínios como fonte de proteína ou de cálcio, ele opta por consumir uma fonte pobre em ferro. Isso é o mesmo que dizer que ele deixa de consumir uma boa fonte de ferro, já que essa proteína ou cálcio poderiam ter vindo acompanhados do ferro tivesse ele escolhido, por exemplo, uma castanha, uma leguminosa ou o tofu no lugar do derivado lácteo. Esse é um ponto crucial na questão do ferro na dieta vegetariana: a maioria dos vegetarianos que desenvolve anemia ferropriva o faz porque inclui na dieta uma quantidade grande de um alimento pobre em ferro (laticínios), o que acaba por roubar o espaço de outro alimento que poderia ter sido escolhido dentre as boas fontes de ferro. O alerta é bastante claro: os lacto-vegetarianos e os ovo-lacto-vegetarianos têm maior probabilidade de desenvolver anemia ferropriva do que os veganos. Alimentos refinados como o açúcar branco e a farinha também são fontes nulas de ferro. Prefira as versões integrais e o seu aporte de ferro aumentará.
Depois de sabermos quais são os alimentos vegetais que contêm bastante ferro e quais são fontes pobres do mineral, devemos nos atentar aos fatores que afetam a sua biodisponibilidade, ou seja, a eficiência com que ele é absorvido pelo organismo. Antes disso, precisamos entender qual é a diferença entre o ferro encontrado nos vegetais e aquele encontrado nos produtos de origem animal.
O ferro encontrado nas carnes é composto em 40% pelo ferro do tipo heme e 60% pelo ferro do tipo não-heme. Já o ferro encontrado nos vegetais é composto em sua totalidade pelo ferro do tipo não-heme. O ferro do tipo heme é mais bem absorvido do que o ferro do tipo não-heme, derivando daí a noção de que o ferro da carne é de melhor qualidade. Mais uma vez, o fato de um tipo ser mais bem absorvido não significa que o outro tipo seja absorvido de maneira insuficiente. O que ocorre com o ferro do tipo não-heme é que o organismo possui uma melhor habilidade de controlar o quanto irá absorver dependendo do status de ferro no organismo e da quantidade de ferro ingerida em uma única refeição. Já com o ferro do tipo heme, o organismo absorve uma taxa fixa, com uma menor capacidade de reduzi-la quando a oferta de ferro é muito alta, podendo inclusive ocasionar uma absorção exagerada do mineral. Ademais, apenas 40% do ferro contido na carne é do tipo que é mais bem absorvido (heme), sendo o restante do mesmo tipo que o ferro encontrado nos vegetais (não-heme).
Para melhorar a absorção do ferro não-heme, uma boa fonte de vitamina C deve ser incluída na dieta. A lista de alimentos fontes de vitamina C vai além dos sucos cítricos frescos, estendendo-se a outras frutas como o morango e a goiaba, entre tantas outras, além de hortaliças frescas (como a couve, por exemplo). A maioria dos alimentos que são frescos, são ricos em vitamina C. Para que a vitamina C tenha ação na absorção do ferro, é importante que ela seja consumida na mesma refeição rica em ferro, e não em uma refeição separada. A distribuição dos alimentos fontes de ferro ao longo de refeições distintas (ao invés de concentrados em uma única refeição) é outro fator importante para otimizar a absorção do ferro não-heme.
Uma dieta vegetariana variada e abundante em alimentos frescos é suficientemente rica em vitamina C ao ponto de melhorar a absorção do ferro encontrado nos vegetais. Vemos ainda que muitos alimentos fontes de ferro são também alimentos fontes de vitamina C, como é o caso dos vegetais verde-escuros, por exemplo.
Acrescentamos a isso a noção de que os alimentos vegetais ricos em proteína e cálcio são os mesmos alimentos ricos em ferro, e podemos concluir que uma boa ingestão de ferro é mera conseqüência de uma dieta vegetariana balanceada em outros nutrientes. Lembrando que essa afirmação é verdadeira apenas se a dieta for isenta de laticínios, que acrescentam pouco e ainda interferem de negativamente na nutrição do vegetariano.
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Dr. George Guimarães, nutricionista especializado em dietas vegetarianas
Fevereiro de 2008
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http://www.nutriveg.com.br/ferro-na-dieta-vegetariana.html
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GatoVerde em defesa dos Direitos Animais
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