VOCÊ FAZ QUESTÃO DE UM CÃO DE RAÇA?
PENSE DUAS VEZES . . .
Sérgio Greif, biólogo
É bastante comum que na busca pela companhia de animais utilizemos critérios raciais como determinante de escolha.
Isso não acontece à toa, vamos à livraria para pesquisar sobre cães e os livros nos dizem qual raça é boa para apartamento, qual raça é boa para se ter com crianças, qual raça fornece bons cães de guarda . . .
Os pacotes de rações para cães trazem sempre imagens de rottweilers, labradores, cocker spaniels ou dachshunds, sempre cães de raça; igualmente as propagandas de produtos voltados para esse mercado ou que utilizam cães apesar do produto não estar relacionado.
Há, portanto, um apelo para que “consumamos” cães de raça e para que, por outro lado, desprezemos cães que não sejam de raça.
É verdade que esse “estigma do cão vira-lata” esteja menos forte atualmente do que estava 15-20 anos atrás, mas ele ainda persiste.
Por outro lado, tendemos a considerar errado julgar as pessoas por sua raça.
Pessoas normais não escolhem, por exemplo, ter amigos brancos ou japoneses e desprezam possíveis amigos negros ou índios, apenas com base em critérios raciais.
Tampouco não vemos com bons olhos publicações que tentam associar determinadas raças humanas com determinados padrões de comportamento.
E mesmo que possamos definir com certa precisão nossa linhagem ancestral, não é de bom tom sustentarmos isso como indício de superioridade ou em conotação de pureza.
E se isso não é bom ou certo no caso de seres humanos, também não o é em relação aos cães e outros animais.
O que são cães de raça?
Como no caso das raças humanas, não há uma sustentação científica para o conceito de raças caninas.
Todos os cães pertencem à espécie Canis familiaris (ou mais recentemente Canis lupus familiaris) e descendem de lobos cinzentos (Canis lupus), que foram domesticados provavelmente há 100 mil anos.
Cães são, portanto, uma subespécie de lobos cinzentos.
Do lobo para o cão há uma grande diferença, mas 100 mil anos de seleção artificial foram suficientes para que o ser humano desenvolvesse milhares de variedades de cães.
Os primeiros critérios adotados pelo ser humano para a seleção de animais de companhia foram sua mansidão.
Lobos muito agressivos eram difíceis de manter; por outro lado, animais mais mansos eram preteridos.
O geneticista russo Dmitri Belyaev observou, quando da domesticação de raposas, que após algumas gerações de procriação seletiva os animais se tornavam mais mansos e desenvolviam comportamentos característicos de cães domésticos que não eram expressos em raposas silvestres.
Mais do que isso, algumas gerações após a domesticação esses animais passavam a apresentar orelhas moles, focinhos mais curtos, padrões distintos de pelagem e cauda erguida.
Possivelmente, os genes que regulam essas características são, tanto o lobo quanto na raposa, ligados aos genes que conferem aos animais maior mansidão.
Podemos entender, por esse estudo de Belayev conduzido em poucas gerações, o que milhões de gerações fizeram ao lobo, possibilitando o surgimento de variedades de descendentes tão distintos quanto um chiwawa ou um dogue alemão.
E ainda assim, todos cães domésticos.
No entanto, quando consideramos geneticamente, o conceito de raças caninas não faz sentido.
O que existe sim são grupos de animais cruzados seguidamente entre si para expressar determinadas características que lhes confere visível semelhança, e algumas vezes a propensão a determinada índole. Mas é só.
Exceto por uma acentuada aparência externa, nada distingue uma raça canina de outra.
Existem, obviamente, linhagens que são maiores e linhagens que são menores, linhagens mais agitadas e menos agitadas, linhagens que se morderem alguém causarão um estrago maior do que outras, até por sua força física . . . mas todas essas características podem ser encontradas também em cães chamados “sem raça definida” – SRD.
Uma pessoa que busca simplesmente um companheiro canino não precisa adquirir um guia de raças que garante que tal linhagem expressa determinado comportamento, não precisa ir a um canil adquirir um cão com pedigree por um preço que pode variam de R$ 200 a R$ 2.000, até porque amigos não se compram.
O que determina que cães são de raça?
O que determina que certo cão pertence a certa raça, que um segundo cão pertence a uma raça diferente e que um terceiro cão pertence a um grupo sem raça definida é um critério absolutamente artificial.
Cães não se reconhecem a si mesmos como pertencentes a raças distintas, como ocorre no caso de raças surgidas de maneira natural.
Mas se não é algo natural, de que forma os critérios raciais surgiram para cães?
Desde sua domesticação, os cães foram empregados pelo ser humano em diferentes serviços (pastoreio, boieiros, caça de pequenos e grandes animais, caça de aves aquáticas, farejadores, guarda, corrida etc.).
Mesmo sem conhecer os fundamentos da genética antes de Mendel, o ser humano sabia, por fatores empíricos, que se cruzasse cães com determinadas características e aptidões teria maior chance de encontrar essas mesmas características em suas proles.
Esse processo se acentuou ainda mais a partir do surgimento dos Kennel Clubs, no século XIX.
Desde então, cães já não eram mais cruzados para fornecer animais mais aptos para realizar trabalhos, mas simplesmente como hobby, com o intuito de selecionar os que expressassem determinadas características físicas.
Para alcançar as características desejadas, valia até mesmo apelar para o endocruzamento, ou seja, o cruzamento entre irmãos, país e filhos, avôs e netos etc.
Os Kennel Clubs criaram o sistema de registro de raças, onde das milhares de linhagens selecionadas ao longo destes 100 mil anos de domesticação e que persistiram até os dias de hoje, entre 150 e 400 variedades são hoje reconhecidas como raças (o reconhecimento de uma determinada linhagem como raça varia de Kennel Club para Kennel Club).
Uma pessoa que pegue um livro sobre raças caninas do mundo inteiro poderá identificar nas fotos determinados padrões de cães conhecidos e que nem mesmo sabia pertencerem a raças.
Isso porque esse padrão racial somente é reconhecido em determinadas localidades, por determinados Kennel Clubs.
Vira-latas poderiam, portanto, ser incluídos dentro de determinadas raças, ainda que não pudessem ser considerados puros, por desconhecermos sua procedência.
Apenas esses fatos já servem para demonstrar que o conceito de raças caninas não é um conceito bem fundamentado.
Consequências do repetido endocruzamento de cães
Embora a seleção artificial de cães remonte ao paleolítico, o conceito de raças caninas, que devem obedecer a determinados padrões, possui menos de 150 anos.
Algumas raças atuais remontam a tempos bastante remotos, como é o caso do cão d´água português, que possivelmente já era criado pelos fenícios, o afghanhound, que remonta ao século III a.C., do Rottweiler, já utilizado pelos romanos e de tantos outros, no entanto essas raças, como dito, formaram-se a partir de diversos animais distintos que expressavam determinadas aptidões e características.
Não havia uma pressão para que os cães não se misturassem com outras linhagens e endocruzamentos praticamente não ocorriam, e quando ocorriam, eram acidentais.
Mesmo sem conhecer os mecanismos da genética, o ser humano sempre soube, de maneira empírica, que o cruzamento entre irmãos ou entre pais e filhos criava uma prole mais frágil. Hoje sabemos que isso acontece porque com o endocruzamento aumenta a possibilidade de que genes raros recessivos se manifestem no organismo.
Quando existe uma variabilidade genética, mesmo com a presença de genes raros deletérios na população, estes raramente se manifestam, porque a própria seleção natural cuida de eliminá-los.
Mas quando a variabilidade genética é pequena, e os animais se cruzam apenas entre si, então surgem as doenças.
Podemos dizer que todos os schnauzers, poodles, dachshounds, cockers, weimaraners e bulldogs são parentes entre si.
Não parentes no sentido que todos os cães são entre si, ou que todos os seres humanos são entre si.
Eles são parentes em primeiro grau, no máximo em segundo grau.
Um cão maltês que nasce na França é praticamente um irmão de sangue de um cão maltês que nasce no Brasil.
Há pouquíssima variabilidade dentro desses grupos.
As consequências dessa baixa variabilidade genética dentro das raças caninas é a grande ocorrência de defeitos congênitos (nascimento de animais com defeitos de formação), a manifestação de doenças e a baixa longevidade.
Existem mais de 500 doenças genéticas conhecidas nos cães, todas elas associadas à baixa variabilidade genética existente dentro das raças.
Raças como os poodles apresentam diversas doenças endócrinas, tumores de mama, hidrocefalia, epilepsia e outras doenças.
Cockers manifestam grande incidência de cataratas, glaucomas e doenças da retina, doenças dos rins e displasia coxo-femural.
Pit bulls, rottweilers e pastores alemães também apresentam maior incidência de displasia coxo-femural.
Outras doenças características do pit bull são a sarna demodécica, problemas de rompimento do ligamento cruzado e parvovirose.
A parvovirose também incide com maior frequência em Rottweilers, que também sofrem com maior frequência de problemas relacionados ao complexo gastroentérico.
Pastores alemães manifestam maior incidência de ataxia, epilepsia, doença de Von Willebrand (problemas de coagulação), cegueiras causadas por pannus oftálmico ou queratite superficial crônica.
Labradores são acometidos por cerca de 20 doenças genéticas, entre elas displasia coxo femoral, retinal, catarata, ausência de testículo etc.
Dachshunds apresentam alta incidência de artrite. Além disso, sua coluna longa ocasiona em maior incidência de problemas de coluna, hérnia de disco, eles são mais propensos a desenvolver problema de cálculos renais, tumores mamários e otites.
Como os animais com pernas mais curtas são mais valorizados, essa característica é selecionada pelos criadores, ocasionando em animais com pernas tão curtas que acabam arrastando a barriga e as orelhas no chão.
Entre os yorkshires existe maior propensão à endocardiose, hidrocefalia, diversas afecções dermatológicas, musculoesqueléticas, cânceres de testículo e de hipófise, colabamento traqueal, hiperadrenocorticismo, nefropatias e afecções urinárias diversas, várias gastroenteropatias, catarata, atrofia da retina, distrofia da córnea, conjuntivite.
O pinscher, além da sarna demodécica, com frequência apresenta epilepsia, problemas cardíacos e problemas de luxação de patela (rótula), que pode até demandar uma cirurgia.
Além dessas doenças genéticas, há ainda outro problema relacionado ao cruzamento endogâmico, que é o favorecimento de características estéticas que resultam em comprometimento da vida do animal.
Por exemplo, o padrão de raça estabelecido para dachshunds diz que quanto mais baixinho, melhor.
Então o criador busca produzir animais que literalmente se arrastam pelo chão, pois esses são mais valorizados.
É óbvio que para o animal isso resulta em péssimas condições de vida e muitos desses “salsichinhas” até evitam se locomover muito.
Cães da raça rhodesian ridgeback necessitam, por padrões raciais, apresentar uma faixa saliente no dorso, e para isso que são selecionados.
Essa faixa apenas se forma no animal como consequência de uma espinha bífida, portanto, selecionar animais para que apresentem essa crista nas costas é selecionar para que nasçam com esse problema.
Essa crista ainda propicia que um quisto (sino dermóide) se desenvolva entre os tecidos subcutâneos e o tecido muscular, causando infecção.
Nos canis comerciais, quando um rhodesian ridgeback nasce sem a crista, frequentemente ele é morto antes que a noticia se espalhe.
Isso é indício de comprometimento da qualidade do plantel.
Raças como o sharpei e o mastiff napolitano tem como padrão racial a necessidade de apresentar pregas na pele. E quanto mais pregas melhor.
Ocorre que essas pregas são regiões propensas ao acúmulo de sujeira e umidade e, como consequência, ao surgimento de dermatite, seborreia e micoses.
Além disso, pregas demais limitam os movimentos do animal, comprometendo também sua visão.
Muitas vezes são necessárias cirurgias para remover pregas da frente dos olhos.
Adicionalmente, sharpeis apresentam problemas de tireoide, problemas de pele e pelo e mal funcionamento do fígado e dos rins, o que ocasiona em dificuldade de biotransformar e eliminar toxinas do organismo.
Sharpeis também com frequência apresentam mordedura prognata, ou seja, os incisivos da arcada inferior se fecham à frente dos incisivos da arcada superior.
Algumas raças de cães, como os bulldogs, o boxer, o pequinês e o pug apresentam mordedura prognata como padrão de sua raça.
Em muitos casos o prognatismo é tão acentuado que, mesmo quando o cão está com a boca fechada, pode-se ver seus dentes e a língua.
No padrão dessas raças também há uma valorização de animais com cabeça curta, alta e enrugada, focinho curto, enrugado e voltado para cima, com narinas amplas, o que torna sua respiração pesada e difícil.
Com frequência esses animais apresentam prolapso dos olhos (olhos saltados da órbita, ou caídos) e pernas tortas.
Esses animais tem maior propensão a apresentarem problemas cardíacos, com grande incidência de cânceres, problemas articulares e epilepsia.
Portanto, ao buscarmos por animais que obedecem a determinados padrões raciais estamos buscando pela expressão de características artificialmente selecionadas e que com frequência representam doenças e má qualidade de vida para o animal. Ao selecionar animais de acordo com suas características raciais, agimos como nazistas ou eugenistas, que estabeleceram padrões para a forma como seres humanos devem ser.
Além disso, agindo dessa forma estamos contribuindo para toda uma cadeia de negócios fundamentada na exploração animal.
*
A EXPLORAÇÃO DOS CÃES DE RAÇA
Quem pensa em cães como companheiros, melhores amigos do homem etc., deve pensar duas vezes antes de comprar um cão em um pet shop.
Cães vendidos em pet shops possuem exatamente os mesmos sentimentos que qualquer outro cão.
São dóceis, companheiros e adoram a companhia humana.
Porém, junto com tudo isso, ao comprar um cão o comprador adquire um certificado de linhagem (pedigree) e toda a história de sofrimento que está por trás desses animais.
Animais de pet shop podem ser animais fofinhos pelo ponto de vista do comprador, mas pelo ponto de vista do produtor de animais e do vendedor, eles são apenas produtos ou mercadorias.
O objetivo de um criador de cães é o lucro e ele só alcança esse lucro se conseguir maximizar sua produção.
Para que isso aconteça, ele deve fazer com que seus cães se reproduzam o máximo possível.
Isso significa que cada fêmea matriz deve ter o máximo de ninhadas no menor tempo possível.
Os filhotes nascidos nessas condições abastecem a “indústria dos animais de estimação”.
Os canis que fornecem animais de raça para abastecer a esse mercado podem variar desde indivíduos que possuem algumas fêmeas matrizes, até grandes canis comerciais contendo dezenas, centenas de animais.
Em todos os casos, quem sai perdendo são os cães.
Animais são condicionados a viverem por toda a sua vida em gaiolas recebendo apenas água e alimentos, produzindo ninhada atrás de ninhada, até que sua vida reprodutiva acabe e seja ela mesma comercializada ou abandonada em algum local.
Filhotes nascidos sem as características raciais consideradas dentro do padrão ou com leves imperfeições são mortos de imediato, pois a presença desses animais na ninhada compromete a imagem das matrizes.
Após um breve período mínimo de amamentação esses animais são encaminhados para pet shops onde são vendidos para pessoas que mal conhecem sua história de sofrimento anterior.
Sim, a exploração de cães em canis é uma forma de exploração animal tão grave quanto qualquer outra,
E não se trata realmente de fazer uma distinção entre o “bom” criador e o “mal” criador, ou de criticar o comércio de fundo de quintal e valorizar o comércio que ocorre sob supervisão de um Kennel Club ou de alguma entidade de proteção animal.
A criação de cães de raça é em si um erro, porque ela produz animais que em verdade só existem para atender à futilidade e aos padrões de estética que nós estipulamos.
Seres humanos que de fato gostam de cães não fazem distinção entre cães de raça e cães sem raça definida.
Quem deseja um amigo de verdade . . .
Uma pessoa que realmente deseja ter um cão como amigo, e não como um produto, uma mercadoria, não faz distinção entre um cão de raça e um cão sem raça definida.
Os cães são sinceros em sua amizade para conosco, eles não fazem julgamentos se somos brancos ou negros, altos ou baixos, milionários ou mendigos, perfeitos ou deficientes, cabeludos ou carecas . . . eles nos aceitam como somos porque seu amor é desinteressado.
Para que nossa parte da amizade possa ser tão sincera quanto o é a parte deles, precisamos ser tão desinteressados quanto eles mesmos.
Ter amizade é querer o bem.
Queremos que nossos amigos vivam muito, sejam saudáveis . . . não que tenham pedigrees e doenças genéticas, ou que satisfaçam nosso ego e sejam abandonados quando enjoarmos deles.
Queremos que nossos amigos sejam criaturas que vivam conosco porque nos adotamos mutuamente e porque precisamos deles tanto quanto eles precisam de nós.
Amigos não se compram.
Se adquirimos nossos amigos de estabelecimentos que lucraram com sua exploração, nossa parte da amizade não é sincera.
Amigos não tem beleza ou feiura.
Se escolhemos nossos amigos com base em características estéticas não são amigos o que procuramos.
Amigos não são feitos em formas, não obedecem a padrões, não tem raça.
Eles vem do jeito que vierem e nós os amamos.
Um cão em nossa casa é companhia garantida.
Alegria não de possuir um bem, mas de manter um amigo, compartilhar nossa vida com alguém por muitos anos.
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*Sérgio Greif – Biólogo, mestre em Alimentos e Nutrição, membro fundador da Sociedade Vegana, autor de livros, artigos e ensaios referentes à experimentação animal, aos métodos substitutivos ao uso de animais na pesquisa e na educação, à nutrição vegetariana, ao modo de vida vegano e aos direitos animais, entre outros temas.
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Fonte: http://www.olharanimal.org/adocao/artigos/98-voce-faz-questao-de-um-cao-de-raca-pense-duas-vezes
VEJA O VÍDEO “SEGREDOS DO PEDIGREE”
O documentário chama a atenção para o alarmante problema que muitas raças de cães vem sofrendo
devido as modificações genéticas das raças impostas pelo homem. ( Discovery Channel – Legendado)
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GATOS? CLARO… MAS POR QUÊ DE RAÇA?
Sérgio Greif*
Todos conhecemos esse ditado “De noite, todos os gatos são pardos”.
Mas o que esse ditado quer dizer?
Exatamente isso, que no escuro não se pode diferenciar a cor de um gato, se ele é preto, branco, amarelo, siamês de olhos azuis ou vira-lata malhado.
No escuro não se pode distinguir a cor e, com frequência, a raça de um gato. De noite todos os gatos são marrons e pronto.
Os critérios raciais não deveriam ser utilizados para a escolha de uma companhia animal, pelos mesmos motivos que não escolhemos nossos amigos com base em critérios raciais, cor da pele, cor dos olhos etc.
Essas ideias foram bastante defendidas no texto “Você faz questão de um cão de raça? Pense duas vezes . . .”, mas creio que elas fazem ainda mais sentido no caso de gatos.
Ao contrário dos gatos, saber a qual raça um cão pertence significa saber que ele pode ser pequeno como um chiwawa ou grande como um dogue-alemão, que será peludo como um sheep-dog ou pelado como um fox paulistinha, que será ativo como um whippet ou bonachão como um basset hound.
Gatos, por outro lado, são relativamente homogêneos, diferindo principalmente em relação à pelagem.
A explicação para essa menor variabilidade de formas entre os gatos em relação aos cães encontra-se em um fato bastante simples.
Conforme explicitado no texto anterior “Você faz questão de um cão de raça? Pense duas vezes . . .“, as diferentes raças de cães evoluíram ao longo de milhares de anos para desempenharem trabalhos para o ser humano.
Outros animais domesticados precisavam ser selecionados para produzir mais carne, mais leite, mais lã . . .
Gatos, porém, jamais foram utilizados senão como animais de estimação e caçadores de ratos.
Ao contrário dos cães e outros animais, gatos jamais se tornaram animais 100% domesticados, preservando muito mais de sua independência e características selvagens.
A domesticação do gato
A domesticação do gato ocorreu no Oriente Médio, mais precisamente no Crescente Fértil, entre o que hoje são o Iraque, a Síria e Israel, por volta de 10 – 9 mil anos atrás. Sua domesticação está associada ao início da agricultura. O armazenamento de grãos atraía ratos, que por sua vez atraiam predadores, entre eles uma espécie de gato selvagem, o Felis silvestris lybica.
Os humanos, percebendo o benefício de manter esses predadores próximos aos silos, em um primeiro momento deixaram de afugentá-los, depois passaram a alimentá-los e então estes se tornaram menos ariscos ao contato com seres humanos.
Cinco mil anos após temos indícios da real domesticação dos gatos. No antigo Egito, os gatos deixam a condição de animais sinantrópicos e passam a ser comensais, coabitando efetivamente e gozando da estima dos seres humanos.
No antigo Egito gatos tornaram-se divindades (a Deusa Bastet), havendo leis específicas que proibiam desrespeitá-los ou exportá-los para fora do império.
Embora essa proibição, gatos deixaram o Egito em navios fenícios, especialmente devido à sua utilização como caçadores de ratos. Assim, eles se espalharam pelo Mediterrâneo e, mais tarde, pela Europa. Há quase 2.500 anos gatos também foram levados para o Extremo Oriente e, devido à inexistência de espécies de gatos selvagens com os quais pudessem se cruzar nesses locais, sofreram isolamento reprodutivo, dando origem a novas linhagens de animais (gatos siameses, gatos persas etc.).
Apesar da variabilidade surgida com os sucessivos cruzamentos realizados em todo o mundo, o que levou ao surgimento de linhagens hoje chamadas “raças”, a verdade é que o nosso gato doméstico (Felis catus) não difere significativamente de seu precursor, o gato selvagem (Felis silvestris lybica). Ambas as espécies se cruzam entre si e sequer podem ser distinguidas geneticamente.
O que são gatos de raça?
Como no caso das raças humanas e das raças caninas, não há uma sustentação científica para o conceito de raças de gatos. Apenas cerca de uma dúzia de genes é responsável pelas diferenças na cor, comprimento e textura dos pelos, assim como por outras características mais sutis. Basicamente é isso o que permite distinguir uma linhagem de gatos de outras linhagens.
O que hoje são consideradas raças de gatos são, na verdade, linhagens de gatos artificialmente categorizadas em animais de pêlo longo, de pêlo curto e de pêlo ralo. Animais de pelagem lisa, de pelagem ondulada, de pelagem intermediária, de olhos castanhos, verdes, azuis, enfim, não são realmente raças, mas padrões de coloração e textura de tegumento.
Atualmente reconhece-se entre 60 e 250 diferentes raças de gatos, dependendo da sociedade felinofílica em questão. A maior parte dessas raças foi desenvolvidas a partir do século XIX, mediante o cruzamento aleatório ou seletivo de diferentes gatos, em sua maioria gatos sem raça definida com traços específicos, de modo a destacar as características consideradas desejáveis.
Essas características, porém, não dizem respeito a atributos que tornam a vida do animal melhor, senão que são atributos externos que quanto muito servem para selecionar animais diferentes e assim satisfazer o ego de seus proprietários em possuir animais mais ou menos peludos, de determinada cor de olho, etc.
Exceto por uma acentuada aparência externa, nada distingue uma “raça” de gatos da outra, e nada distingue um gato de raça de um gato sem raça. Uma pessoa que tenha em mãos um livro de raças de gatos não terá dificuldade em perceber que todos os gatos sem raça que ela conhece se encaixam no perfil de alguma das raças de gatos ali expostas.
A diferença básica entre gatos considerados sem raça e gatos considerados de raça está, então, na maior variabilidade genética presente nos gatos sem raça, o que possibilita que mesmo que um deles se cruze com um outro gato com aparência semelhante á sua, parte da ninhada não se pareça em nada com os pais.
No caso de gatos de raça, por serem resultado de sucessivos cruzamentos entre gatos com a mesma aparência, por muitas gerações, a possibilidade de que alguns filhotes da ninhada não se pareçam com os pais é menor.
Desvantagens da seleção genética de gatos
Conforme escrito acima, não houve até o século XIX uma preocupação humana em realizar cruzamentos seletivos de gatos. Mesmo os antigos egípcios, que popularizaram a criação de gatos a ponto de transformá-los em divindades, aparentemente não possuíam variantes da espécie, até porque traços diferentes provavelmente não haviam ainda surgido. Todos os gatos de então eram cinzas tigrados, como a espécie selvagem da qual derivaram.
No entanto, a partir do século XIX, começou-se, especialmente nas Ilhas Britânicas, a realizar o cruzamentos planejado de gatos de forma a acentuar-se características físicas diferentes. Tais cruzamentos não tinham outro motivo senão satisfazer o ego de proprietários que se rejubilavam em possuir animais diferentes do que normalmente se encontrava. Em 1871 foi realizada a primeira exposição de gatos, em Londres, onde linhagens como as hoje conhecidas persa e siamesa foram apresentadas ao público europeu.
A existência dessas linhagens, porém, não se constitui em nenhuma variabilidade genética. Em verdade, poucas mutações genéticas podem ser responsáveis por mudanças em padrões de pelagem, e pelo surgimento de linhagens de gatos malhados, com pelo mais longo, etc. A variabilidade não está no aspecto externo que nos permite diferenciar raças de gatos, mas dentro das populações que mantém-se cruzando sem pressão da criação seletiva. As chamadas “raças puras’, portanto, contribuem pela menor variabilidade genética dos gatos.
Mesmo antes de havermos conhecidos os fundamentos básicos da genética mendeliana, o ser humano sabia, de maneira empírica, que o cruzamento de animais aparentados aumentava as chances de obtenção de filhotes com defeitos de nascença ou com saúde debilitada. Isso levava a que o camponês evitasse cruzar pais com filhos, irmãos com irmãos.
Conhecemos hoje os motivos para evitarmos endocruzamentos. Quando animais aparentados se cruzam entre si, genes raros que seriam eliminados pela seleção natural acabam sendo preservados. Populações homogêneas geneticamente estão mais sujeitas a serem exterminadas por uma doença do que populações mais diversificadas.
Populações mais diversificadas escondem genes deletérios recessivos a ponto deles raramente se manifestarem na população. A natureza favorece as populações geneticamente heterogêneas. Mas quando a variabilidade genética é pequena e os animais se cruzam apenas entre si, então surgem as doenças.
Podemos dizer que todos os gatos siameses, persas, sagrados da Birmânia, devon rex, angorás, bombays, sphynx são parentes próximos entre si e existe pouca variabilidade genética dentro dessas populações de gatos ditas de “raça pura”.
As consequências dessa baixa variabilidade genética dentro das raças felinas é a grande ocorrência de defeitos congênitos (nascimento de animais com defeitos de formação), a manifestação de doenças e a baixa longevidade.
Existem mais de 150 doenças genéticas conhecidas nos gatos, todas elas associadas a genes recessivos que se manifestam com maior facilidade em animais com baixa variabilidade genética.
Apenas para exemplificação, o gato siamês, raça popular cuja linhagem mais antiga remonta à Tailândia, provavelmente ao século 14, possui uma enorme lista de doenças congênitas. Esses gatos sofrem, com maior incidência, de doenças como asma, tumores de mamas, astenia cutânea, hipomotilidade esofágica, mastocitomas cutâneos, hipotricose, glaucomas, lesões cervicais, displasia na bacia, síndrome hiperestésica felina, alopecia endócrina felina, adenocarcinomas no intestino delgado, mucopolisacaridose, mucopolisacaridose VI, gangliosidose, diversos defeitos cardíacos congênitos, fibroelastose endocardíaca primária, estrabismo, vesgueira, nistagmo, esfingomielinose, hidrocefalia, ceratite crônica degenerativa, amiloidose hepática, distócia, hiperlipemia familiar, gengivite-periodontite juvenil felina e porfiria.
Gatos persas, também bastante populares, sofrem de uma variedade de problemas de saúde, muitos deles de origem genética tais como manosidose, seborréia, doença renal policística (PKD), síndrome de Chediak-Higashi, anquilobléfaro congênito, entrópio, epífora congênita, glaucoma primário, pseudocistos periféricos, luxação patelar, displasia na bacia, sequestro de córnea, atrofia retinal progressiva, distócia e gengivite hiperplásica juvenil, entre outras doenças.
O gato sagrado da Birmânia remonta aos gatos criados nos templos budistas daquele país. Todos os gatos sagrados da Birmânia hoje conhecidos descendem de um único exemplar trazido para a Europa na década de 1920 e cruzado com um gato siamês. Esses animais com frequência sofrem de cardiomiopatia hipertrófica, mal progressivo e hereditário que afeta gatos em geral. Caracteriza-se pelo espessamento da parede do ventrículo esquerdo e decorrente mau funcionamento do coração. Os sintomas são batimento cardíaco irregular, apatia, dificuldade para respirar e aumento da frequência respiratória. Em certos casos, depressão, intolerância a exercícios e paralisia das patas traseiras. Há pacientes assintomáticos. Suas consequências são edema pulmonar, tromboembolia sistêmica (coágulos de sangue) arritmia cardíaca, desmaio, arroxeamento de mucosas e morte súbita. Além disso, esses animais apresentam, com maior frequência, dermóide epibulbar nos olhos, displasia da bacia, azotemia (elevação de nitrogênio no sangue), axonoplastia distal e encefalomielopatia, peritonite infecciosa felina (PIF), anomalias na granulação de neutrófilos, cálculos renais e tromboembolia.
O gato Himalaia, originado do cruzamento de gatos de linhagem persa, siameses e em alguns casos sagrados da Birmânia, por volta de 1930, desenvolve com frequência as mesmas doenças dos gatos persas. As principais doenças que incidem nessa linhagem são; astenia cutânea, doença renal policística (PKD), catarata, alopecia, psicogênica, sequestro corneal e peritonite infecciosa felina (PIF). O gato tonquinês, originado do cruzamento entre gatos siameses e sagrados da Birmânia na primeira metade do século XX, com frequência sofrem de cálculos renais, infecções do trato respiratório superior e apresentam grande sensibilidade às vacinas.
O gato burmês, trazido para a Europa do sudeste asiático no inicio do século XX e lá misturado com outras raças, com frequência sofrem de síndrome do olho seco, erosão da cartilagem da terceira pálpebra, má-formação médio-facial letal, desmóide ocular, fibroelastose endocardial primária, meningoencefalocele, miopatia hipocalêmica, diabetes, polimorfismo restrito de genes de antígeno de leucócito felino DRB, glaucomas e síndrome de peito plano em filhotes.
O maine coon, gato gigante originário dos EUA, é uma raça estabelecida por volta de 1860. Apesar de serem gatos rústicos e bem tolerantes a variações de clima, sofrem com frequência de displasia na bacia, cardiomiopatia hipertrófica, luxação patelar, doença renal policística (PKD), gengivite-periodontite juvenil felina, pectus excavatum e deficiência de alfa 2 laminina, o que causa distrofia muscular e miopatias. Outro gato de porte mais avantajado, o ragdoll, desenvolvido também nos EUA entre as década de 1950 e 1960, com frequência sofrem de cardiomiopatia hipertrófica, mucopolissacaridose, peritonite infecciosa felina (PIF) e tromboembolia.
A raça conhecida como gato abissínio, na verdade é de origem indiana. Sua criação iniciou-se em 1860, a partir de alguns poucos animais levados para a Europa. São animais que apresentam, com frequência, atrofia, degeneração progressiva ou displasia de retina, sequestro corneal, alopécia psicogênica, luxação patelar, amiloidose renal, doenças por armazenamento de lisossomos, peritonite infecciosa felina (PIF), gengivite hiperplástica, deficiência de piruvato quinase e tromboembolia.
A linhagem de gatos conhecida como raça somali é na verdade uma variante pelo longo de gatos abissínios com pedigree. Todos os exemplares hoje reconhecidos como pertencentes a essa raça derivam de um mesmo casal de abissinios. Esses animais com frequência apresentam problemas de gengivite, atrofia retinal progressiva e deficiência de piruvato quinase. O cruzamento entre gatos abissínios e siameses em 1964 deu origem à raça ocicat, com padrão de pelagem semelhante ao da onça. Esses animais com frequência apresentam pectus excavatum.
As chamadas raças pelo curto são, em verdade, os gatos mais comuns presentes em cada localidade derivadas não do cruzamento seletivo, mas da mistura de linhagens nas ruas das cidades. Entre essas raças temos o gato pelo curto inglês, pelo curto americano, pelo curto europeu, pelo curto brasileiro. Apesar de não se tratar de populações geneticamente homogêneas, há doenças que incidem com maior severidade nessas populações. Por exemplo, o gato pelo curto inglês, descendente provável dos gatos que foram introduzidos pelos romanos na Grã-Bretanha, tem maior propensão para apresentar eritrólise neonatal e hemofilia B. O pelo curto americano tem maior propensão a apresentar doença renal policística (PKD) e cardiomiopatia hipertrófica.
O gato chartreaux, raça originária do Oriente Médio trazida pelos Cruzados para a França, sofreu grande seleção artificial na década de 1930, sendo que os exemplares dessa raça padecem, com frequência, de displasia da bacia e luxação patelar.
O cornish rex, raça originária da Inglaterra cuja principal característica são os pelos ondulados e crespos. Todos os animais hoje reconhecidos como pertencentes à raça derivam de um único exemplar isolado na Cornualha em 1950. Animais dessa raça com frequência sofrem de hipotiroidismo, hipotricose e peritonite infecciosa felina (PIF).
O devon rex, raça surgida não por cruzamentos seletivos, mas por mutações aleatórias, foram observados pela primeira vez em 1950, na Inglaterra, e vem sendo desde então criados. Caracterizam-se por possuir pelo bastante curto e enrolado, o que lhe confere aspecto impressionante. Essa raça normalmente apresenta animais com displasia na bacia, hipotricose, espasticidade, hipotiroidismo, luxação patelar, síndrome de peito plano em filhotes, coagulação anormal do sangue e outras disfuncionalidades sanguíneas, miopatia autossômica recessiva, coagulopatia vitamina K dependente e distócia.
O sphynx, apesar de parecer fruto de manipulações genéticas, não o é. Trata-se de animal resultado de mutação genética recessiva e espontânea, denominada alopecia hereditária. Os animais hoje reconhecidos como pertencentes à raça derivam de uma ninhada nascida em 1966 no Canadá. Europeus e norte americanos se interessaram por esses gatos devido ao seu aspecto pouco comum e começaram a criá-lo, cruzando-os com o devon rex, o cornish rex e pelo curto americano. Desses cruzamentos nasceram muitos animais com doenças genéticas tais como espasticidade.
O gato anão, também chamado munchkin, na verdade não é uma raça anã de gatos, mas de gatos de tamanho normal com pernas curtas. A ocorrência de gatos de pernas curtas é natural, dado a genes autossômicos dominantes. No entanto, sua criação e seleção para expressão dessa característica só se iniciou em 1983, sendo todos os munchkin reconhecidos como da raça derivados de uma única fêmea chamada Blackberry. Devido a essas pernas curtas esses animais apresentam com frequência lordose. Esses animais também são mais suscetíveis a sofrer de síndrome de peito plano em filhotes e pectus excavatum.
O gato korat, uma das raças mais antigas do mundo, é originário da Tailândia. Foi porém introduzido no ocidente com apenas alguns poucos exemplares que foram cruzados entre si, resultando em animais com pouca variabilidade genética. Esses animais com frequência apresentam ganglidiose e doença de Sandhoff (ganglidiose GM2).
Os gatos da raça manx originaram-se provavelmente de gatos que sobreviveram ao naufrágio de galeões espanhóis em 1588, havendo conseguido nadar até a Ilha de Man (Grã Bretanha). São gatos cujo traço mais característico é a ausência de cauda, embora alguns exemplares apresentem caudas de tamanhos variados. Outra característica dessa linhagem é o andar saltitante derivado de seu dorso arqueado, devido à má formação da espinha (espinha bifida e disgenesia sacrocaudal). Também, seu ânus mais estreito (atresia anal) os leva a com frequência sofrer de prisão de ventre, prolapso retal e incontinência fecal. Essa raça com frequência apresenta distrofia da córnea.
O gato norueguês da floresta é provavelmente resultado do cruzamento de gatos domésticos levados para a Escandinávia pelos vikings a partir da Grã-Bretanha com gatos selvagens locais. Sua criação ficou restrita à Noruega até a metade do século XX, quando alguns exemplares foram levados para outras partes da Europa. Não se sabe ao certo quantos animais deram origem às linhagens consideradas raça pura, porém, esses animais com frequência sofrem de doença de armazenamento de glicogênio tipo IV. Além disso, sua criação resulta em sofrimento para os animais, visto se tratar de animais adaptados ao frio e a ambientes abertos.
A raça de gatos scottish fold originou-se a partir de uma única fêmea nascida na Escócia em 1961. Ela se caracterizava por possuir as orelhas curtas ou dobradas (fold significa dobra, prega), devido a um gene dominante. São gatos longevos (15 anos) porém que apresentam grande suscetibilidade a doença renal policística (PKD), cardiomiopatia, osteocondrodisplasia, má formação de estruturas ósseas (anomalias nas vértebras) e artrite, resultando em dores severas e incapacitantes nas juntas, perda de mobilidade e endurecimento das cartilagens, além de prognastismo.
A raça de gatos bengal foi originada em 1963 mediante o cruzamento de um gato doméstico com um gato leopardo asiático (Prionailurus bengalensis), produzindo uma prole de animais férteis. A intenção era obter animais com pelagem semelhante ao gato leopardo que fossem mais afáveis ao ser humano. Todos os gatos bengals que existem resultam de alguns poucos hibridos nascidos desses cruzamentos iniciais, sendo que esses animais apresentam uma série de doenças genéticas, entre elas: Entrópio, alopecia psicogênica, atrofia progressiva de retina, neuropatia distal, cardiomiopatia hipertrófica (HCM) e peritonite infecciosa felina (PIF). Há ainda uma doença que se caracteriza por um ressecamento da pele do nariz conhecida como Bengal Nose.
Há outros híbridos de gatos domésticos com gatos selvagens: O caracat, híbrido de gatos abissínios com o lince-do-deserto (Caracal caracal), surgido em 2007.
O savannah, híbrido do serval africano (Leptailurus serval) com gatos domésticos (bengal, entre outros), surgiu pela primeira vez em 1986, mas por apresentar problemas de fertilidade precisou ser “reinventado” novamente em 1994.
O chausie é resultado de cruzamentos de gato da selva africano (Felis chaus) com gatos abissínios e de outras linhagens, entre as décadas de 1960 e 1970.
É provável que grande parte dos animais que nasçam de tais hibridizações ou do cruzamento entre animais híbridos apresentem problemas congênitos e más formações, porém, não encontramos estatísticas referentes a isso.
O preço da beleza
As pessoas buscam pelo diferente em padrões de gatos como buscam pelo diferente em objetos de decoração. No entanto, diferentes de objetos, gatos sofrem quando nascem ou vivem portando genes que não deveriam possuir. Os mesmos genes que dizem que gatos terão pernas curtas como a do munchkin ou longas como a do bengal, pelos longos como do persa ou curtos como o do sphynx, caudas longas como a do himalaio ou caudas curtas como a do manx e orelhas curtas como a do scottish fold, dizem que eles terão dificuldades em suas vidas.
A única explicação para que as pessoas tenham tal preocupação em preservar genes raros e muitas vezes deletérios em populações animais é que a preocupação nunca é de fato com o bem do animal. Uma pessoa que ama gatos pode ter um gato, ela não precisa de um sagrado da Birmânia ou de um devon rex. No entanto pessoas que fazem questão de gatos de raça não amam gatos, elas amam o ‘status’ de possuir algo diferente como um animal com pedigree. Ora, elas que comprem um carro importado!
Quando um casal procura aconselhamento genético ele não quer selecionar filhos que nasçam com nanismo, hidrocefalia, albinismo, espinha bífida ou seis dedos na mão porque quando planejamos nossa família pensamos no bem das crianças e não em ter filhos que se destaquem na multidão. Selecionar gatos para que tenham pelagem bluepoint e encantadores olhos azuis, não se importando com seu estrabismo, é mesquinho, egoísta e fútil.
Gatis e pet shops são atividades comerciais que visam unicamente o lucro, e não o bem dos animais. Eles não pensarão duas vezes antes de cruzar animais aparentados, fazer fêmeas engravidarem seguidamente para produzirem uma vasta prole e descartarem no lixo filhotes que nasçam sem atender aos critérios raciais estipulados pelos clubes de felinofília. Clubes de felinofília e exposições de gatos, igualmente, são atividades vazias e sem nenhuma profundidade, voltadas para satisfazer o ego de pessoas fúteis que não amam realmente seus gatos.
Milhares de gatos vivem atualmente nas ruas das grandes cidades, muitos deles estão aprisionados em centros de controle de zoonoses e entidades que recolhem animais de rua. Pessoas que realmente amam animais não precisam gastar comprando animais, elas podem adquirir gratuitamente um animal de um desses abrigos, já castrado, e certamente estarão fazendo um bem para o animal.
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*Sérgio Greif é biólogo, mestre em Alimentos e Nutrição, membro fundador da Sociedade Vegana, autor de livros, artigos e ensaios referentes à experimentação animal, aos métodos substitutivos ao uso de animais na pesquisa e na educação, à nutrição vegetariana, ao modo de vida vegano e aos direitos animais, entre outros temas.
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Fonte – http://www.olharanimal.org/adocao/artigos/97-gatos-claro-mas-por-que-de-raca
VEJA O VÍDEO – “O GATO COMO ELE É”
http://www.youtube.com/watch?v=bRGP7DZhO2M
NOTÍCIA
PEDIGREE GERA CÃO COM SAÚDE EM FRANGALHOS
Thiago Fernandes – Colaboração para a Folha – 12/12/2011 – 14h50
Ser buldogue não é lá muito fácil. Um estudo publicado neste ano na revista científica “Journal of Veterinary Internal Medicine” mostrou que, entre as raças de cães, são os que mais correm risco de morrer de doenças respiratórias. São ainda a segunda raça que mais morre de doenças congênitas.
O problema é tão grave, relata o “New York Times”, que criadores da raça estão discutindo alterar os rígidos padrões de pedigree para permitir que os animais tenham mais qualidade de vida.
São as características da raça que acabam levando os buldogues a sofrer com doenças.
Os buldogues não são exceção. “Desde a domesticação, o homem seleciona o que acha adequado em cada animal”, diz José Bento Sterman Ferraz, professor de genética da Faculdade de Zootecnia da USP.
O problema é quando a opinião do ser humano não é a mesma que teriam os animais.
E a seleção artificial acaba resultando em problemas de saúde para os cães.
É o que acontece com as raças de focinho curto, como o pug e o boxer. Motivada apenas pelo que os criadores consideram ‘bonito’, essa característica tende a causar problemas respiratórios, que se agravam cada vez que são escolhidos como modelo os com a cara mais achatada.
INCOMPATÍVEIS
“O homem vem impondo padrões que chegam a ser incompatíveis com o próprio funcionamento fisiológico do animal”, afirma Ferraz.
Em outros casos, os problemas surgem não devido à escolha direta de características, mas por causa de cruzamentos de indivíduos muito próximos geneticamente, o que estimula a disseminação de doenças recessivas.
Marco Ciampi, da ONG Arca Brasil, cita o exemplo do pastor alemão, muito comum há 20 anos, mas que perdeu popularidade devido à falta de controle dos casos de Displasia Coxofemural. A doença genética compromete a locomoção e afeta outras raças de grande porte, como o fila brasileiro e o labrador.
Segundo a veterinária Fernanda Kerr, da Arca Brasil, o problema já foi mais grave no passado. “A displasia está sendo mais controlada pelos criadores antes do cruzamento. Animais que apresentam o problema são castrados.”
Criador de cachorros há 37 anos, o presidente da Federação de Cinofilia de São Paulo, Paulo Costa, concorda que atualmente há maior conscientização. “Hoje, as mostras de raça levam em conta não só a estética mas também a saúde. De nada adianta você ter um cachorro bonito se ele é um animal doente.”
Esses esforços, porém, podem ser solapados por fatores como a exposição excessiva de uma raça – criadores menos escrupulosos tendem a reproduzir filhotes em massa, que depois acabam até sendo abandonados.
É o caso dos dálmatas após os filmes da Disney.
Muito inquietos, embora dóceis e brincalhões, os cães da raça não se adaptam a espaços pequenos e têm tendência a surdez precoce e cálculos renais, problemas que se agravaram como resultado de cruzamentos indiscriminados.
Um estímulo para criadores se preocuparem com essa questão é o fato de que a disseminação de problemas na raça trazem também prejuízos financeiros. “Para nenhum criador é interessante um cão problemático, porque ninguém vai querer comprar”, afirma Gilmar Barros, do Bulldog Club do Brasil.
Fonte – http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/1020022-pedigree-gera-cao-com-saude-em-frangalhos.shtml
ANIMAIS NÃO SÃO PRODUTOS.
NÃO COMPRE, ADOTE!
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Publicado em CÃES E GATOS
GatoVerde, em defesa dos Direitos Animais
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